quinta-feira, 27 de março de 2008

MARROCOS

Pra lá de Marrakech

Por Lígia Halmenschlager, revisora de Português e corretora de redação.




É quase pra lá de Marrakech, onde os mudos até falam, na tentativa de tirar uma graninha extra na venda de qualquer coisa, ou no auxílio ao turista desavisado que tenta dar uma de “sabe tudo”e se embrenha nas tais medinas. Aqueles labirintos que nem Alá se acha. O tal mudo não têm profissão definida, mas até poderia ter um crachazinho de “Ajudante de guia turístico” nesses emaranhados que qualquer vivente se perde lá no Marrocos...
Quem não gosta disso é tal polícia turística, que está a postos para barrar qualquer tentativa de mudo querer ser guia. E até falar, servindo de intermediário numa negociação de venda de peças de seda. Imagine só a cena! Mas ele é mudo, ou quase, mas burro não é. Burro é aquele que serve pra levar carga pelas medinas da vida, até hoje.
Ele não, é muito inteligente, esperto e bom negociante, como todo árabe. “Fazemos qualquer negócio. Diz, señora, quanto paga”, fala o vendedor nas lojinhas.
“ Son ocho euros”, explica a vendedora de pulseiras e bugigangas na frente dos hotéis dos turistas. Ou aqueles vendedores ambulantes que vêm com pochetes ou bolsas de couro fedidas, tingidas com qualquer anilina de cor, dizendo que são legítimas: “Custa só diez euros”, señora. Sim, porque eles falam um espanhol, com sotaque árabe, pra não perder o freguês. E se você vai partir às 7 horas da manhã, não tem problema, lá estão eles prontos na frente do hotel pra oferecer as fotos do dia anterior a dois euros, sem choro. Sem choro não, porque não existe negociação no Marrocos sem o choro da pechincha. Eles gostam, acho que até não vivem sem isso. E pra vender não tem nem mês de Ramadã que os impeça de negociar, tentar vender coisas falsas por verdadeiras.






Eles não bebem, jejuam durante o dia nesse mês, mas deixar de vender, nunca! À noite, depois que o sol se põe, os homens se vão aos bares beber... chá de hortelã. E só os homens, lá a emancipação feminina ainda está longe de chegar. Elas vão continuar andando na rua atrás dos seus homens, de chelaba (túnicas), às vezes até de burca. E servindo seus maridos. Mais dentro de casa do que fora. Houve tempo em que elas nem janelas tinham em casa, pra não tentá-las a ver o que acontecia na rua. . Já os machos têm direito de casar oficialmente com quatro mulheres, além das concubinas que puderem sustentar. E tinham “a favorita”.
Enquanto você morre de medo de se perder nas medinas, quase morre de tanto comer aquelas delícias marroquinas, tudo regado com muita amêndoa, ameixas, mel e especiarias multicoloridas! E os doces, naquela profusão de cores e formatos espalhados nas bancadas das tiendas das medinas? Se bem que, às vezes, o mau cheiro dos cortes de carne de cordeiro ou gado na bancada à frente não permite que você consiga parar um minuto para apreciá-los! Ou as abelhas que se apropriam deles pelo odor e também expulsam qualquer turista apaixonado pelo doce marroquino.
Isso tudo mesclado às belíssimas avenidas, com palmeiras, fontes, flores e até pés de olivas, que cortam cidades como Marrakech ou Fez. É tanto verde que você esquece que está no Marrocos. E os hotéis que nos oferecem? Contos de mil e uma noites! Com fotos do atual rei, claro, sempre um Mohammed ou um Hassan. Há, quase ia me esquecendo, o tal mudinho que falava se chamava Mohammed também. Nenhuma novidade.

Lígia

Outubro de 2007

Nenhum comentário: